Titeuf,
abreviatura de 'petit œuf '' ('pequeno ovo', por óbvias razões
anatómicas), é uma personagem criada em 1993 pelo autor suíço Zep
(Philippe Chappuis, Onex, Genebra, 1967), pseudónimo que é uma
homenagem aos Led Zeppelin. À partida, ‘Ovinho’ seria uma
tradução aceitável para o nome da personagem, não fora esta ser
por vezes um bocadito alarve: com cerca de oito anos, e um topete que
parece uma hipérbole do cabelo de Tintin, Titeuf é um reguila
desabusado, por vezes malcriado, que quer dar nas vistas para parecer
mais importante e mais crescido do que na verdade é – e também
para que as miúdas reparem em si. Um rapazelho como muitos outros,
portanto... Até hoje foram editados 18 álbuns, com claro sucesso de
público e crítica: tiragem de milhões de exemplares, adaptação a
cinema de animação e o merchandising
habitual.
Em
Petit Poésie des
Saisons (de 2005,
agora reeditado com nova capa) assistimos ao decorrer das estações
do ano, tal como Titeuf e os amigos as vivem; e claro que a poética
a que o título alude não pode deixar de ser irónica: a areia da
praia intromete-se nos mais recônditos e incómodos interstícios; o
salpico de neve que lhe cai em cheio na roupa está longe de ser alvo
e imaculado. Quanto ao mais: a escola, o cair da folha e o
obrigatório Halloween,
no Outono; escola,
bonecos de neve, frio e o Natal, no Inverno; escola, o despertar da
Natureza e das paixões, as partidas do 1.º de Abril, na Primavera;
no Verão, as férias grandes, as festas... e a escola, a começar no
início de Setembro, em eterno retorno de trapalhadas, triunfos e
desaires à escala minorca, sempre acolitado pela família, a
inevitável professora velha e feia, os indispensáveis compinchas, e
uma certa Nadia, a quem Titeuf arrasta a asa, quando distraído das
suas actividades mais sérias, ou seja, pregar partidas e fazer que
estuda.
Em
2001, Zep e Hélène Bruller, então sua mulher, criaram um livro
extra-série, Le
Guide du Zizi Sexuel (Aparelho
Sexual & C.ª,
na tradução brasileira), obra pedagógica destinada aos
pré-adolescentes, que teve a duvidosa distinção de ser apresentada
por Bolsonaro, como exemplo do alegado 'kit gay' e incitamento à
pedofilia...
A
fórmula do gag é clássica: exposição, desenvolvimento e remate,
sempre cómico e/ou inesperado. Há um, porém, que foge a esse
esquema, o dedicado às mentiras do 1.º de Abril: em seis vinhetas
Titeuf prega partidas em casa e na escola, rindo-se a bandeiras
despregadas; na sétima, ao fim do dia, será a vez da televisão
pregar a sua mentira aos telespectadores (assim acreditava o rapaz):
uma intervenção militar no Iraque, diz o pivot, fará milhares de
vítimas. Titeuf não viu onde estava a graça. Os mentirosos eram
outros, já então se sabia.
Titeuf
– Petite Poésie des Saisons
texto
e desenhos: Zep
edição:
Glénat, Grenoble, 2019