Nos idos de 1993 aparecia nas bancas, pelo preço módico de 500 escudos (2,5 euros), um álbum brochado com uma capa apelativa, ao estilo da Escola de Bruxelas, a chamada linha clara. Num cenário nocturno, um piloto acobertado pelos arbustos esconde-se de um par de oficiais alemães – estamos na II Guerra, o fardamento não engana e o lettering com uma silhueta de um Spitfire, também não –; ao fundo, uma rampa de lançamento, as célebres V2 (o 'v' é inicial de Vergeltungswaffe – arma de vingança); no canto inferior direito um logótipo de umas desconhecidas Éditions Sorg, embora o texto estivesse em português. Foi folhear e andar com o livro debaixo do braço. Uma boa surpresa, apesar da fraca qualidade da impressão e letragem por vezes catastrófica, além de um, digamos, divertido lapso na página 14, o texto todo em castelhano... Trata-de de uma edição publicada em França, em 1988, com versões noutras línguas.
Estamos em 1943, o vento está a soprar em desfavor dos países do Eixo, e a aquela arma seria o último trunfo de Hitler, que Churchill quer neutralizar. Num aeródromo inglês, aguarda-se a chegada do capitão Harris, da USAF, que virá observar o ataque da RAF às instalações secretas alemãs onde são produzidas as V2, na cidade costeira de Peenemünde, no Báltico. A recebê-lo, dois militares: o general Carrington, em prévio diálogo avisa: “Ponha-se na retranca, tenente Tenton, o capitão Harris tem fama de engatatão. Casou três vezes, não sei se me entende?!”; e a tenente Tenton, das Informações, em resposta fleumática: “”Aviões, cerveja e miúdas, o lema de todos os pilotos de combate, Sir!”
Apesar da acção dinâmica e bem encadeada, o argumento falha rotundamente. Harris, um duro acowboyado, é um poltrão, um violador na forma tentada, o que é mostrado com ligeireza, para não dizer condescendência; depois, verifica-se uma oscilação nunca resolvida entre um registo de erotismo brejeiro, os quadros de batalha aérea e a angústia de quem levanta voo sem saber se estará de regresso, portanto, nem carne nem peixe. Jacques Sorg (1954) é um argumentista modesto, com meia dúzia de álbuns auto-editados.
O desenho é muito outra coisa. Percebe-se a juventude do autor, um traço já pessoal mas ainda inseguro, porém, criatividade na construção das pranchas e personalidade tudo isso tem o jovem E. Bravo, de 24 anos, estreando-se aqui em álbum. Neste ano desgraçado de 2021, é um dos mais notáveis autores de BD franco-belga: Émile Bravo (Paris, 1964), de quem já aqui falámos a propósito da recreação da história de Spirou, a partir de 2011 com Le Journal d'un Ingénu e L´Espoir malgré tout, de que já saíram dois dos quatro álbuns planeados.
Este Fighters foi um belo tirocínio para Bravo, mas porque o “herói” era rasante, a série não teve continuidade.
Fighters – Operação Peenemünde
texto: J. Sorg
desenhos: E. Bravo
edição: Éditions Sorg, Boulogne, 1988
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