Numa América assolada pelo proibicionismo da Lei Seca e pelo gangsterismo que a originou, o agente da Lei tem de ter cara de poucos amigos, e preparar-se para esmurrar ou disparar, quando for preciso, os patifes cujo fácies nada ficava a dever a James Cagney ou Edward G. Robinson nos seus piores momento.
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domingo, 24 de outubro de 2021
domingo, 28 de junho de 2020
Dick Tracy
No que respeita aos
comics a primazia deve-se a
Chester Gould (1900-1985) e ao detective policial que criou, Dick
Tracy. Surgido em dois jornais,
em Nova Iorque e Detroit, em 1931, em pleno vigor da “Lei Seca”,
à sombra da qual medrou o crime organizado, com o seu cortejo de
horrores, disposição legal que viria a ser revogada na presidência
de Franklin D. Rossevelt, um dos grandes presidentes da história dos
Estados Unidos.
A
diferença de Dick Tracy relativamente a recriações recentes como o
magnífico Torpedo, de
Enrique Sánchez Abuli e Jordi Bernett, reside na circunstância de
este se tratar de uma recriação, com a justaposição da pátina
que o tempo histórico lhe deu, ao passo que Dick Tracy evoluía
durante o calor dos acontecimentos. Talvez por isso a violência e a
crueza que por vezes é apontada à série se explique por essa
contiguidade com o crime, trazido em manchetes pelo mesmo jornal que
publicava Dick Tracy, em tiras diária e páginas dominicais. Acresce
à verosimilhança da violência o atractivo dos gadgets
a que o detective lançava mão e à prática científica forense
apresentada de forma meticulosa, pois o próprio Chester Gould tirara
vários cursos para documentar-se.
Mas o principal
trunfo de Dick Tracy deve-se, quanto a nós, à mestria narrativa do
autor, com uma influência do cinema, nomeadamente nas elipses e
cortes de planos. Gould possuía uma mestria narrativa que prendia a
atenção do leitor. Neste mesmo livrinho, por exemplo, numa única
tira, com apenas três vinhetas – dando sequência à do dia
anterior e procurando interessar o leitor pela continuação no dia
seguinte – cada quadrinho corresponde a lugares diferentes da
história: o espaço da vítima, o dos criminosos e a esquadra de
polícia (cfr. tira central da página 27).
O
Caso 3-D, a história desta
edição, datada de 1957, é um vulgar episódio de extorsão, muito
bem contado. Cabeça de Lata, a personagem central, magnata do
petróleo, detentor de uma fortuna colossal e vários casamentos,
decide visitar um dos sete irmãos, após 30 anos de ausência. Este
é BO Plenty (Farfalha, na tradução brasileira), um hillbilly
– ou seja, uma dessas figuras
rústicas, que vivem em clã nas zonas montanhosas da América do
Norte, celebrizados também pelos comics e
pelo cinema – e a cuja família, em particular às jovens
sobrinhas, quer presentear com uma modelar casa de banho... Este
Farfalha, ex-criminoso tornado amigo de Tracy, foi um elemento de
contraponto humorístico, para suavizar a violência negra do
argumento. Ao mesmo tempo, Poly, ex-mulher de Cabeça de Lata e
gananciosa, mancomunado com o amante, 3-D Magee, não olham a meios
para extorquirem o possível ao velho tycoon.
No fim, é fatal, o bem triunfa sobre o mal. Rima e tomara fosse
verdade.
Dick Tracy -- O Caso 3-D
argumento e desenhos: Chester Gould
sábado, 18 de abril de 2020
«Strapontam e o Monstro de Loch Ness»
Criado
em 1958, por Berck (Arthur Berckmans, Lovaina, 1929) com argumentos
de René Goscinny (1926-1977), Strapontam, fardado e ao volante de
uma dona-elvira amarela, não é o taxista das voltas ao obeslico da
Praça da Concórdia, mas antes o chofer das corridas improváveis...
Strapontam, para
respeitar a fonética original do nome deste motorista bonacheirão,
Strapontin, e não
acontecer o que se passou com Tintin,
que entre nós nunca foi Tantam,
a não ser para quantos frequentaram o liceu francês...
Publicado
na revista Tintin
belga em 1961 e no ano seguinte em álbum, Strapontam e o
Monstro de Loch Ness fala-nos de
uma deslocação à Escócia, a pedido de um amigo, o Professor
Feijão Verde (Petitpois, no original) – o cientista que descobriu
o carburador em pó... –, para que o filho, o jovem Wimpy,
aperfeiçoe o inglês, numa temporada no castelo do velho tio Mac
Lloyd, situado à beira do célebre Loch Ness, Com ambos segue o cão
Gerardo, cujas características antecipam de algum modo uma outra
criação de Goscinny, agora com Morris: Rantanplan, o cão mais
estúpido do Oeste, surgido no álbum de Lucky Luke, também em 1962,
Na Pista dos Dalton.
Goscinny
tira partido das idiossincrasias dos britânicos: a condução à
direita, a horrível dieta à base de carneiro cozido, molho de
hortelã e o plum-pudding,
aliás, o tipo de humor que vamos encontrar em Astérix
entre os Bretões (1965); na
Escócia: problemas com falsários de uísque, a personalidade forte
dos escoceses, com os seus kilts
e gaitas de foles, e o inevitável Nessie.
Na
segunda história, Strapontam e o Gorila (1962),
o taxista acompanha Feijão Verde, Wimpy e Gerardo ao território de
Grododo, onde coexistem os grandes símios e os acérrimos Molomolós.
O professor desta vez engendrara um extracto à base de hormonas de
peixe, cabeças de fósforo e cenouras, susceptível de desenvolver a
inteligência dos primatas, ao ponto de pôr o gorila a falar latim –
ou seja, Goscinny puro, com uma certa inversão do paternalismo, em
que os indígenas, por entre os trajes e práticas tradicionais,
exibem um discurso de habitantes sofisticados das metrópoles. O
mesmo sucederá com Astérix...
O
traço de Berck é muito característico. Vindo da BD religiosa,
publicada pelos jesuítas belgas, as suas influências estão nos
comics americanos.
Parece haver ali algum reflexo de Chester Gould (Dick
Tracy), adaptado à
sensibilidade infanto-juvenil da época e, comprovadamente, de E. C.
Segar, o criador de Popeye
– o nome da personagem Wimpy,, é uma homenagem àquele, evocando o
inenarrável comilão de hambúrgueres. Em suma, pode dizer-se,
entre o desenho característico de Berck e o álacre humor de
Goscinny, que a série envelheceu, mas bem, apesar de tudo.
Strapontam
e o Monstro de Loch Ness,
seguido de Strapontam e o Gorila
texto: René
Goscinny
desenhos: Berck
edição:
Editorial Íbis, Lisboa, 1965
quinta-feira, 18 de dezembro de 2014
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