Fim de ano, tempo de
balanço a propósito dos 40 livros de que falámos aqui, desde
Julho. Se sobre a Bdteca não há grande coisa a dizer, a não ser
lembrar autores e personagens, de Tintin a Batman, de Will Eisner a
Tardi, não nos vamos eximir a assinalar o que mais nos impressionou.
Mais e melhor, já que a grande vantagem de não ser
crítico é a de escrever sobretudo a propósito do que se gosta.
«Leitor de BD», foi a designação que propusemos para estas
crónicas de impressões subjectivas, com o lastro de mais de meio
século de convívio, desde as tiras do Professor Nimbus no saudoso
Diário de Lisboa, e de uns patos que ainda hoje podem ser
companhia, depende de quem os trace.
Na BD de expressão
portuguesa, elegemos como melhor livro O Coleccionador de
Tijolos, de Pedro Burgos (Chili com Carne), esplêndida
harmonia entre texto e desenhos, parábola de um país ultrajado
entre a mentalidade troikista da pobreza e o recurso impudente ao
dinheiro fácil, mesmo que tudo seja para arrasar. O desenho é
soberbo em todas as suas dimensões, traço e plano em prancha; a
edição cuidada faz jus ao que publica, Salientamos ainda Filhos
do Rato, de Luís Zhang e Fábio Veras (Comic Heart e G. Floy
Studio), o escaranfuchar nas cicatrizes e nos traumas da Guerra
Colonial, escrito e traçado com sangue por quem nem era nascido
quando ela terminou, sem dúvida um dos livros do ano; Entre
Cegos e Invisíveis, de André Diniz (Polvo), uma
esplêndida narrativa de estrada, cheia do insólito que ela pede,
num Brasil que teima em desencontrar-se; Conversas com os Putos
e com os Professores Deles, de Álvaro (Insónia), ou a saga
de ser-se profe de geometria descritiva quando a vida a todos faz
tangentes.
Quanto à BD
estrangeira,uma escolha cem por cento franco-belga. Spirou –
L'Espoir Malgré Tout – 1. Un Mauvais Départ, de Émile
Bravo (Dupuis) – ou a audácia de empreender a releitura de uma
personagem canónica da BD europeia, num trabalho surpreendente e de
largo fôlego, e cuja continuação aqui acompanharemos. Duke –
Sou uma Sombra, de Yves H. e Hermann (Arte de Autor), este um
dos maiores nomes da BD em todas as latitudes, num formidável
western, género sempre em reinvenção; tal como Undertaker
– 1. O Devorador de Ouro, de Xavier Dorison, Ralph Meyer e
Caroline Delabie, tanto um como outro, personagens em busca de si
próprios. A lista termina com o volume I de O Diário
de Esther – Histórias dos Meus 10 Anos, de Riad Sattouf
(Gradiva), excelente descoberta que é um desafio, o acompanhar de
toda a adolescência de uma criança com empatia e humor, além disso
trazendo inovações formais, marca de um autor de excepção.
A melhor capa: a
majestade do desenho de Roberto Gomes, em Mar de Aral (G-Floy
Studio e Comic Heart), com texto de José Carlos Fernandes, trabalho
que ganha ainda mais consistência após a leitura desta fantástica
narrativa curta.
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