quinta-feira, 2 de abril de 2020

«O Regresso de Tomahawk Tom»

Thomahawk Tom é uma curiosa personagem da BD portuguesa, criada por Edgar Caygill (!), cujas aventuras foram publicadas no Mundo de Aventuras, Condor e Jornal do Cuto. Cowboy mestiço, filho de uma cheyenne, tem todas as qualidades do herói positivo; sem defeitos, seria figura demasiado plana, não fora essa miscigenação étnica que permite o contacto entre os dois maiores antagonistas deste universo: os colonos invasores europeus, secundados pelo exército norte-americano e as nações indígenas. A dupla pertença é-lhe, aliás, constantemente apontada, normalmente sob a forma de insultos, como “meia-casta”, a que ele normalmente dá de ombros, com fleuma. Acompanha-o Jacky, um adolescente resgatado ainda criança num acampamento em que decorrera o massacre dos progenitores perpetrado por índios.
Este ‘Caygill’ é um pseudónimo conjunto de Roussado Pinto (1926-1981?), um dos figurões do pulp lusitano (o célebre Ross Pynn), e do seu desenhador, Vítor Péon (1923-1991), um dos nomes de referência dos quadradinhos portugueses em meados do século passado.
Em O Regresso de Tomahawk Tom – Tempestade em Dakota Sul, Péon encarrega-se também do texto. A história aborda os normais tópicos do western: neste caso, o início da construção da linha férrea transcontinental, ligando os Estados Unidos costa a costa; a primeira a concluir o traçado que lhe fora cometido, ganharia um prémio atribuído pelo governo. Pistoleiros e tiroteio, sabotagem, ciladas, caçadores de bisontes, índios Sioux, a Cavalaria, todos estes motivos de coboiada aqui comparecem. A fuga ao cliché, para além da condição étnica do protagonista, é a circunstância de tratar-se de um indian friendly western, consagrado já noutras partes e media, como no cinema, maxime O Soldado Azul (1970), de Ralph Nelson, com a inesquecível música de Buffy Sainte-Marie.
A narrativa é fluida e o desenho extraordinariamente dinâmico, não sendo perfeccionista. No geral, estamos uns furos abaixo de um Blueberry a que Péon, em nossa opinião foi beber, ou não considerasse Jean Giraud, num pequeno ensaio que escreveu, como “um dos maiores, senão o maior autor de B.D. 'Western' […] não só da Europa, mas também da América» (A Banda Desenhada como Arte, 1979).
Edição do autor, com uma tiragem de dez mil exemplares, foi um flop comercial, inviabilizando outras séries que Péon aí anunciava: Sax, um corsário com paixão pela leitura, e o Reverendo Benedict Jr., cujas frases heterodoxas prenunciam as tiradas do nosso já conhecido Undertaker: “Será mais fácil a un homem justo passar pelo fundo de uma agulha do que a um homem mau escapar à mira do meu Colt!!!”
Escorreita BD western, O Regresso de Toamahawk Tom tem certamente um lugar numa biblioteca básica da BD portuguesa.

O Regresso de Tomahawk Tom – Tempestade em Dakota Sul
texto e desenhos de Vítor Péon
edição do Autor, Lisboa, 1975


2 comentários:

  1. Foi no jornal do cuto que descobri o "cow-boy", mas agora ando a ler o Condor Popular, que a par do Ciclone, foram os meus primeiros livros de BD. eram mais baratos do que os outros, que se vendiam emm meados de 60.
    Abaço!

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    1. No meu caso, era o "Falcão", já nos 70...
      Outro abraço

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