sexta-feira, 24 de abril de 2020

comando devastado

Personagem criada por Greg e William Vance em 1967, sob os auspícios da Guerra Fria, Bruno Brazil, homem de missões impossíveis, agente do WSIO (World Security Internacional Office), chefiado pelo Coronel L. (Lazarus D. Walsh), aparece ainda muito ligado aos clichés jamesbondianos; cedo, porém, vai largando os lugares-comuns da espionagem, com as narrativas a decorrerem num páthos de angustiosa conspiração e contornos mais difusos, em que a política dos dois blocos é “apenas” o cenário em que tudo se move. Um dos atractivos da série é a chamada “Brigada Caimão”, um comando que Brazil lidera, constituído por elementos de inusitada ou duvidosa proveniência, artistas de circo, cadastrados, vigaristas...

Greg e William Vance são dois dos maiores nomes da BD franco-belga. Referi-los é o mesmo que nomear Achille Talon, Bernard Prince, Bob Morane, Comanche, Olivier Rameau; XIII – e até Spirou e Fantásio, e Tintin (o argumento de Tintin e o Lago dos Tubarões pertence a Greg); ou Marshal Blueberry, desenhos de Vance, a convite de Giraud, que assegurava os argumentos após a morte de Charlier.... Pegar numa série emblemática, saída das mãos de autores deste coturno é sempre um risco, daí que não haja propriamente avanços, ou talvez seja ainda cedo para tal. Quando Greg se tranfere para os Estados Unidos, assegurando a direcção local da editora Dargaud, precisou acalmar a produção infrene que a imaginação lhe oferecia. Por isso, em Tudo ou Nada para Alak 6 (1977) faz dizimar metade da Brigada Caimão, numa missão em Madagáscar, o que dá aos autores destas Novas Aventuras de Bruno Brazil ensejo a não deixar tudo na mesma, mesmo mantendo fidelidade ao cânone.
Laurent-Frédéric Bollée (Orleães, 1967) situa o tempo da acção nos meses após a carnificina naquela grande ilha do Índico. A tragédia está ainda fresca neste primeiro álbum, intitulado Black Program. Bruno faz psicanálise; mas o Coronel L. depara-se com o desaparecimento (ou fuga?) de um cientista da Nasa, autocobaia da expreriência de injecção no próprio ADN de gigas de informação sensível, circunstância que faz dele uma base de dados classificados ambulante. A segurança do estado requer a recomposição do que sobrou do comando: Gaucho Morales, alguém que gosta de viver a vida, mesmo que de forma pouco ortodoxa, o único que parece ter saído incólume da catástrofe, a palpitante Whip Rafale, agora paraplégica, e o problemático Tony o Nómada, trupe de pós-traumatizados com que Bruno Brazil terá de contar. Philippe Aymond (Paris, 1968) é um desenhador de méritos firmados, co-autor, de Lady S., outra série em torno de serviços secretos, com argumento de Van Hamme, e passagem por Lisboa. Aymond não se “livrou” totalmente de Vance, mas tem estofo para tal. Os dados estão assim lançados, e, entre mistérios, traumas, atentados e dramas pessoais, sabemos ainda muito pouco ao fim deste primeiro tomo. À boa maneira das revistas semanais de BD, (continua), pois claro!

Bruno Brazil – Black Program – t.1
texto: Laurent Frédéric Bollée
desenhos: Philippe Aymond
edição: Le Lombard, Bruxelas, 2019
edição portuguesa: Gradiva, Lisboa, 2020

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