domingo, 18 de outubro de 2020

«As Conspirações do Grão-Vizir Iznogoud»


 

Quanto a nós, a grande personagem de René Goscinny é Iznogoud, o pérfido grão-vizir (primeiro-ministro) do bondoso califa de Bagdade, Haroun-el-Poussah, ambos passados ao papel pelo desenhador Jean Tabary (1930-2011). O talento da dupla confluiu para a criação de uma figura inesquecível: um olhar vivo e mau numa cabeça que parece um binómio com soluços, um símbolo depravado do yin e yang taoísta assente num corpo de metro e meio e um nome que diz tudo. Sempre acolitado por um sicário chamado Dilat Larat, Iznogoud tem a obsessão de querer ser califa no lugar do califa, e para tal não olha a meios.

A série surge em 1962 num semanário sem grande história, e a apresentação trazia logo a marca humorística de Goscinny na sua designação: As Aventuras do Califa Haroun-el-Poussah... um nababo de rosto sonolento e aparvalhado, sempre solícito para com as ideias do “seu bom Iznogoud”. O recurso desabusado ao trocadilho, os impasses criados pelo cómico de situação, a inigualável vileza, levaram o grão-vizir ao pódio das mais emblemáticas narrativas goscinnyanas, com Lucky Luke. Humpa-pá, Astérix...

Por razões que desconhecemos, o primeiro álbum, Le Grand Vizir Iznogoud (1966), não teve edição portuguesa, ao contrário do seguinte As Conspirações do Grão-Vizir Iznogoud (originalmente publicado em 1967), composto por seis narrativas breves. Em “Há rã no Califado”, surge um batráquio que era um príncipe amaldiçoado a precisar de ósculo redentor; porém, quem o beijava transformava-se por sua vez em rã. É claro que Iznogoud entrará nos aposentos do califa com uma ideia bem precisa em mente... Em ”Os olhos dilatados”, Iznogoud assiste num teatro de Bagdade aos prodígios dum hipnotizador que aliciará para sugestionar o bom Haroun-el-Poussah de que afinal é um asno; infelizmente para o grão-vizir, umas simples palmas bastavam para que tudo voltasse ao normal, e o califa para as almofadas. “O filtro ocidental” mostra um alquimista europeu criador duma poção que tornava mais leve que o ar quem a bebesse; cobaia de si próprio foi parar a Bagdade; Iznogoud tudo fará para que o soberano ingira o elixir e que bom vento o leve. “A máquina de viajar no tempo”, tem a curiosa participação do próprio desenhador, Tabary, que parece se atrasava nos prazos de entrega das pranchas... Segue-se “O piquenique” – que lugar melhor para fazer um senão no deserto? Iznogoud convence o califa disso mesmo, pretendendo abandoná-lo à sede. Escusado será dizer que tudo se conjuga para a ocorrência de água de todas as maneiras. Finalmente, “Caçada cruzada”, uma taça encantada faz com que quem beba por ela troque de corpo com quem lha passou. Neste breve obra-prima de humor, Iznogoud vê finalmente coroada a persistência, tornando-se califa no lugar do califa. Mas tal golpe palaciano terá sido bem sucedido?


As Conspirações do Grão-Vizir Iznogoud

texto: René Goscinny



desenhos: Jean Tabary

edição: Meribérica, Lisboa, s.d.

«Leitor de BD», jornal i

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