domingo, 4 de outubro de 2020

«O Juramento dos Vikings»

 


Há uma tira de Hagar o Horrível, em que o víquingue criado por Dick Browne, chegado a França para a pilhagem, vê um burguês gritando aos quatro ventos “Cachez vos belles!”, receoso do estupro a que as mulheres estariam sujeitas; quando Hagar vislumbra um estafermo à janela, é o próprio que grita desalmadamente: “Cachez vos belles!” Ah, os víquingues!… Historicamente, Levaram tudo à frente, da Europa Oriental ao Norte de África. Pagãos relapsos por muito tempo, tanto se lhes dava arriar em cristãos como em muçulmanos. Ao rei de França impuseram um extenso domínio, a terra dos homens do Norte, os normandos – essa Normandia que viria a estar na origem da Guerra dos 100 anos... Para deles se proteger, Mumadona Dias, Condessa de Portucale (c. 943-950), mandou erigir uma larga torre que deu origem ao castelo de Guimarães; Mediterrâneo adentro, atiraram os árabes ao mar, criando o reino normando da Sicília...

Hoje voltamos a Peyo (Pierre Culliford, 1928-1992), depois de Kim Kebranoz, e também ao mar, depois de Raven, na semana passada. E a própria pirataria não está de todo ausente, uma vez o autor, belga de pai inglês, é descendente de um flibusteiro do século XVII, Robert Culliford, parceiro e depois inimigo do célebre Capitão Kidd (1645-1701), corsário escocês. Les Aventures de Johan aparecem no jornal belga La Dernière Heure, em 1946. Trata-se de um escudeiro com traços de Príncipe Valente disneyficado, habitando numa Idade Média de transição, por volta do século X, e que ao terceiro álbum, já na revista Spirou, ganhará em Pirlouit – um anão truculento que tem uma cabra por montada – um digno Sancho Pança, ou um Haddock, um Fantásio, um Obélix... Em Portugal tomaram o nome de João e Pirolito.

O Juramento dos Vikings, álbum original de 1958, sem a panóplia de feiticeiros, ogres, gigantes, pequenos seres azuis (os Schtroumpfs apareceram aqui) que caracterizam a série, é um episódio bastante linear: de regresso de uma missão que lhes fora confiada pelo rei, e após uma trapalhada de Pirolito, caído ao mar vestido, os dois amigos são acolhidos por uma família de pescadores. Um dos quatro filhos, pela idade e porte, destoa do resto da família. Não tardaremos a perceber de que se trata de um jovem rei destronado pelo regente, que em segredo fora escondido naquela recanto isolado. Há guerra civil no reino da Snoelândia, e sem noção do que está em causa, julgando ser o rapaz o filho mais velho do pescador, João e Pirolito vêem-se envolvidos numa disputa entre dois grupos – os que querem matar o jovem e os que querem resgatá-lo para que se sente o trono.

A partir daqui, há um corrupio por entre mares e ilhas, enseadas e castelos, espadeirada de meia-noite, em vinhetas que compõem pranchas com um óptimo dinamismo visual.

João e Pirolito – O Juramento dos Vikings

texto e desenhos: Peyo

edição: União Gráfica, Lisboa, 1967

«Leitor de BD«, jornal i

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