Edibar
da Silva é um extraordinário anti-herói: bebedolas, louco por
cerveja (uísque também serve) consumida em casa diante da televisão
ou no boteco do Bigode, de preferência na companhia do amigo
dilecto, Zé Manguaça. Só uma vez, neste livro inicial recentemente
editado, percebemos o que este zerói (obrigado,
Ziraldo!...) faz na vida: trabalha para o município, num
daqueles veículos pesados que fazem a recolha dos excrementos no
saneamento básico. Para evitar ferir susceptibilidades –
confirmámo-lo numa entrevista –, não sabemos qual o 'time' por
que torce. Aliás, política, religião e futebol, são temas que o
autor evita propositadamente; mas também não fazem grande falta: a
riqueza da velhacaria de Edibar, como a de, vez por outra, a de
muitos de nós, é tal, que não falta material ao autor, o
brasileiro Lucio Oliveira, natural do Paraná.
Da internet e da
imprensa local para o mundo lusófono (para já), Edibar é dono de
um Fusca (Carocha) de 1968, um cão chamado Gole – a criatura mais
inteligente da série – e consorte de “uma mulher chata”, nas
suas palavras e por esta ordem de importância… Trata-se da
abnegada Edimunda, moura de trabalho que sai do sério quando o
marido abusa da mandriice; um estafermo no que respeita à beleza,
não destoando do par, que, por sua vez, não se comove com as
tentativas falhadas de sedução, mesmo com recurso a lingerie
sensual, por parte da esposa. Edibar é uma espécia de casanova de
bairro com as mulheres dos vizinhos – Cornélio que o diga –, e
nem a esposa do médico, o Dr. Sarado, cujo armário do quarto Edibar
costuma frequentar, por vezes na companhia do Zé Manguaça, é
poupada, sem esquecer todo um lote de garotas de programa, não
admirando, pois, os queixumes de Edimunda. A família alarga-se à
sogra, a Dona Ana Conda, que nutre um correspondido ódio pelo genro,
Edipai e Edimãe, surdos que nem portas e velhos gaiteiros
nostálgicos, e o ainda o sobrinho Edinho, leva e traz de quiproquós.
Toda esta patota
reside na Vila Xurupita, uma homenagem ao Zé Carioca de Ivan
Saidenberg e Renato Canini, e a todos esses maravilhosos favelados,
Nestor, Pedrão & C.ª, madraços à medida do humor doutras
crianças, mais inocentes nesse então.
Edibar, com a sua
boçalidade, ignorância e leveza existencial lembra alguns
antecessores. Desde logo Andy Capp / Zé do Boné,
do inglês Reg Smythe, que O Primeiro de Janeiro
publicava – nesses tempos em que havia tiras aos magotes nos
jornais... –; ou ainda, fora do mundo dos quadradinhos, o especioso
Archie Bunker da série da CBS dos anos 70 All In The
Family. Politicamente
incorrecto, machista, grosseiro, tudo se conjuga neste cromo através
da perspicácia e agudeza de Lucio Oliveira.
Edibar,
vol. 1
texto e desenhos:
Lucio Oliveira
edição: Polvo,
Lisboa, 2019
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